A utilização do pedido de recuperação judicial como estratégia de negociação. Os ensinamentos do caso Avianca

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É comum que os profissionais que atuam na área de Recuperação Judicial se deparem com questões que envolvam (ou não) a possibilidade da expropriação dos bens dados em garantia pelas Recuperandas a terceiros, mesmo em se tratando de operações que não se sujeitam à Recuperação Judicial.

Isto porque, a jurisprudência contemporânea, em prol de um conceito denominado “função social da empresa”, chancelado pelo artigo 47 da Lei n°11.101/2005, passou a admitir casos excepcionais, nos quais, em caso de inadimplemento da Recuperanda, obstam a satisfação da garantia pelo Credor e facilitam a reorganização da sociedade empresária em crise.

Diante desse quadro, o presente artigo tem como objetivo demonstrar que a jurisprudência especializada, por conta de algumas incongruências legais, criou uma alternativa para ajudar o empresário na superação de um momento de grave crise, justamente amparado pelo Princípio da Função Social da Empresa.

Pois bem, a Lei n°11.101/2005, em seu artigo 49, §3º, excluiu dos efeitos da Recuperação Judicial os créditos derivados de alienação fiduciária, o arrendamento mercantil, os contratos de venda com reserva de domínio e os contratos de venda e compra de imóveis que contem cláusula de irrevogabilidade ou de irretratabilidade.

Contudo, o legislador consignou, nesse mesmo dispositivo, que os bens de capital essenciais à atividade da empresa não podem ser expropriados dentro do período de 180 dias, contados da decisão de concedeu a Recuperação Judicial (“Stay Period”).

Disso, depreende-se que a Lei 11.101/2005 concedeu ao empresário um período para reorganizar suas atividades, antes de começar a sofrer com a retirada de seus bens de capital essenciais. Porém, em alguns casos práticos, os 180 dias concedidos mostram-se insuficientes para as companhias em recuperação reorganizarem sua estrutura empresarial.

Ainda que a Lei de Recuperação Judicial e Falência estabeleça que o Stay Period é improrrogável, esse impedimento tem sido mitigado por decisões judiciais que alongam o referido prazo suspensivo.

Tais decisões evidenciam a intenção de privilegiar o direito da Recuperanda em detrimento do direito de seu Credor, impedindo na prática a transferência da posse dos bens de capital essenciais para o soerguimento da empresa em Recuperação Judicial.

A jurisprudência tem caminhado no sentido de trazer uma espécie de equilíbrio entre as relações jurídicas estabelecidas antes do Pedido de Recuperação Judicial, abarcando uma espécie de “revisão contratual” dos créditos não sujeitos, pois o contrário inviabilizaria o soerguimento da empresa e mitigaria o Princípio da Preservação da Empresa.

Portanto, a decisão pelo Pedido de Recuperação Judicial pode ser enxergada como um meio de se obstar, parcialmente, o exercício regular do direito dos credores, criando-se uma ferramenta para a renegociação das operações que não se submetem aos efeitos recuperacionais.

Nesse sentido, a sistemática acima pode ser exemplificada pelo caso “Avianca”, que ajuizou um Pedido de Recuperação Judicial recentemente, na segunda metade do ano de 2018.

Em resumo, a empresa possui em sua esquadrilha apenas aeronaves obtidas por arrendamento mercantil (leasing), as quais, por força do disposto no artigo 199 da Lei 11.101/2005, não se submetem aos efeitos da Recuperação e, tampouco, estão garantidas pelo Stay Period.

Em que pese à literalidade da Lei, o Juízo Especializado de Recuperação Judicial e Falência responsável pelo caso, em primeiro grau, obstou que os arrendantes exercessem seu direito de reaver as aeronaves da Avianca e aplicou o Stay Period até a realização da Assembleia Geral de Credores, pois, o contrário, acarretaria na quebra da empresa.

Em grau de recurso, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), decidiu que se aplicaria o Stay Period, fazendo a ressalva de que as aeronaves estavam desabilitadas para voos, o que, na prática, também inviabilizaria a continuidade das operações da companhia aérea e, por consequência, ensejaria a convolação da Recuperação Judicial em Falência.

Ato contínuo, acertadamente, o Ministro do Superior Tribunal de Justiça, João Otávio Noronha, monocraticamente, em sede de “Suspensão de Liminar e de Sentença” (SLS nº 2485/SP 2019/0050422-8), suspendeu a decisão proferida pelo TJSP, sob o fundamento de que haveria “grave lesão à ordem e à economia públicas”.

Nesse meio-tempo, a “Avianca” ganhou fôlego, mantendo suas operações em pleno funcionamento e, atualmente, encontra-se em adiantadas tratativas para promover a venda de parte de sua operação à outra companhia área.

Portanto, o que se viu na prática foi uma decisão acertada da empresa em se socorrer ao instituto da Recuperação Judicial, uma vez que as garantias asseguradas pela Lei 11.101/2005 possibilitaram à empresa duas interessantes estratégias: (i) impedir que a empresa devolvesse suas aeronaves aos seus arrendantes e (ii) pudesse negociar de forma segura a venda de sua operação e ativos aos players interessados.

Pelo exposto, é possível concluir que a Recuperação Judicial se tornou, mesmo que de maneira empírica, um importante instrumento para as empresas que atravessam crises financeiras dilatarem prazos de pagamentos ou, até mesmo, a exemplo do caso “Avianca”, buscarem no mercado interessados na aquisição de sua operação, preservando-se integralmente sua atividade produtiva e fins sociais.

ANDRÉ CORRADI

FORMAÇÃO ACADÊMICA

Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

ÁREAS DE ATUAÇÃO

André atua nas áreas de Direito Contencioso Cível Estratégico, envolvendo direito civil, recuperação judicial, dentre outros.

Tem experiência em responsabilidade civil, contratos, direito do consumidor e outros.

 

EXPERIÊNCIA

Ex-integrante da Equipe de Contencioso Cível Estratégico do Lobo de Rizzo Advogados.

Ex-integrante da Equipe de Arbitragem e Contencioso Cível Estratégico do Carvalho, Machado e Timm Advogados (CMT).

Ex-integrante da Equipe de Arbitragem e Contencioso Cível Estratégico do Mannheimer, Perez e Lyra advogados Advogados (MPL).

Foto - Thiago

THIAGO QUINTANILHA

Formação acadêmica

Graduado em direito na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – SP (PUC-SP).

Pós-graduado em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Mestrando em Direito Econômico e Financeiro pela Universidade de Bologna, Itália.
Graduado em direito na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – SP (PUC-SP).
 

Pós-graduado em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Mestrando em Direito Econômico e Financeiro pela Universidade de Bologna, Itália.

Graduado em direito na Universidade
Federal Fluminense (UFF), parcialmente cursada na Universidade Sophia
Antipolis (França).

Pós-graduado em Finanças e Contabilidade pela Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP).

Pós-graduado em Direito do Agronegócio pelo
Instituto Brasileiro de Direito do Agronegócio (IBDA).

Especialista em Arbitragem, pela
Fundação Getúlio Vargas (FGV).

ÁREAS DE ATUAÇÃO

Thiago Quintanilha de Almeida é sócio responsável pelas áreas de Contencioso Cível Estratégico e Empresarial.

Thiago Quintanilha de Almeida é sócio responsável pelas áreas de Contencioso Cível Estratégico e Empresarial.

EXPERIÊNCIA

Ex-integrante do Lefosse Advogados.

Ex-integrante do Rocha e Baptista Advogados.

Especialista em Contencioso Cível com ampla experiência em recuperação de
créditos.
Ex-integrante do Lefosse Advogados.

Ex-integrante do Rocha e Baptista Advogados.

Especialista em Contencioso Cível com ampla experiência em recuperação de
créditos.
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