Escrito por Diego Faria e Gustavo Park.
A carga do contencioso tributário no Brasil tem sido um dos maiores obstáculos ao crescimento econômico sustentável, tanto para o setor privado quanto para a administração pública.
Neste contexto, foi publicada a Portaria Normativa MF nº 1.383, publicada em 30 de agosto de 2024, pelo Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para o fim de instituir o Programa de Transação Integral (PTI).
Este programa visa, fundamentalmente, reduzir o contencioso tributário de alto impacto econômico, oferecendo alternativas para regularização de passivos e encerramento consensual de litígios, em linha com os princípios estabelecidos pela Lei nº 13.988/20.
O PTI é uma iniciativa que busca soluções eficazes para litígios fiscais, promovendo a segurança jurídica e a previsibilidade no tratamento de passivos tributários. Este artigo explora as principais características do PTI, suas modalidades e implicações jurídicas, especialmente no que tange ao impacto econômico e à relevância dos temas abordados.
A Estrutura do Programa de Transação Integral (PTI)
O PTI está estruturado em duas modalidades, conforme previsto na Lei nº 13.988/20. A primeira modalidade refere-se à transação para cobrança de créditos judicializados, enquanto a segunda aborda o contencioso tributário relacionado a controvérsias jurídicas disseminadas e de alto impacto econômico.
Na primeira modalidade, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) desempenha um papel central, realizando uma análise detalhada do Potencial Razoável de Recuperação (PRJ) dos créditos judicializados. Essa análise é fundamental para determinar o custo-benefício da transação, tendo em vista o grau de incerteza das ações judiciais e o tempo necessário para sua resolução.
A segunda modalidade, por sua vez, abrange discussões jurídicas de grande relevância, tanto no âmbito administrativo quanto no judicial. Entre os temas de maior destaque estão as controvérsias sobre contribuições previdenciárias, a classificação fiscal de insumos produzidos na Zona Franca de Manaus, e a incidência de tributos em processos de desmutualização da Bovespa.
Transação na Cobrança de Créditos Judicializados
A primeira modalidade do PTI é aplicável exclusivamente aos créditos já judicializados e oferece uma solução negociada para questões que se encontram em litígio no Poder Judiciário. A avaliação realizada pela PGFN busca mensurar a probabilidade de recuperação do crédito, levando em consideração o andamento e a complexidade das ações judiciais. Essa modalidade, disponível por meio do Portal Regularize, é voltada para créditos que já estão em processo de cobrança, mas que ainda não foram inscritos em dívida ativa.
Transação no Contencioso Tributário de Relevante e Disseminada Controvérsia Jurídica
A segunda modalidade do PTI envolve a resolução de disputas jurídicas amplamente disseminadas e com impacto econômico significativo. A Portaria lista uma série de temas prioritários que podem ser objeto de transação, abrangendo desde questões de classificação fiscal de insumos até a tributação de stock options. Esse formato permite que empresas envolvidas em disputas com a Receita Federal ou a PGFN possam negociar seus débitos com base em regras previamente estabelecidas, promovendo uma maior previsibilidade e segurança jurídica.
Os termos da transação são estabelecidos com base nas seguintes diretrizes:
- Valor do Crédito Negociado: A transação poderá incluir múltiplos créditos tributários, desde que sejam objeto de contencioso judicial ou administrativo. No entanto, o contribuinte não poderá fragmentar um único crédito para incluí-lo em ambas as modalidades de transação.
- Descontos Aplicáveis: A concessão de descontos sobre o montante principal da dívida está limitada pelo teto estabelecido pela Lei nº 13.988/20. Para os créditos judicializados, os descontos serão definidos conforme o Potencial Razoável de Recuperação (PRJ), determinado pela PGFN. Já no caso de créditos oriundos de controvérsias jurídicas disseminadas, os descontos dependerão do estágio da disputa e do valor envolvido.
- Parcelamento: O pagamento dos créditos poderá ser feito em até 84 parcelas mensais, desde que o contribuinte respeite as condições estabelecidas pela PGFN e Receita Federal. Para créditos de maior risco ou valor expressivo, poderão ser aceitas garantias adicionais para assegurar a quitação da dívida.
- Utilização de Precatórios e Compensações: A Portaria também prevê a possibilidade de utilização de precatórios federais ou compensação com créditos de prejuízos fiscais e base de cálculo negativa da CSLL para abater parte do valor da transação. Essa condição visa flexibilizar a forma de quitação do crédito tributário, permitindo maior adequação à situação financeira do contribuinte.
Esses termos específicos permitem ao contribuinte maior flexibilidade e segurança jurídica ao negociar seus débitos, oferecendo uma via alternativa de resolução que pode mitigar riscos de contencioso prolongado e reduzir custos operacionais.
Implicações Jurídicas e Econômicas do PTI
A criação do PTI representa uma mudança significativa na abordagem do governo para resolver litígios tributários, permitindo uma maior flexibilidade na negociação de débitos.
Assim, além de reduzir o estoque de processos no contencioso tributário, o programa também tem o potencial de aumentar a arrecadação de receitas, oferecendo alternativas vantajosas tanto para o Fisco quanto para os contribuintes.
No entanto, a implementação do PTI exige uma regulamentação detalhada por parte da PGFN e da Receita Federal, o que inclui a definição de prazos e limites para as transações. As condições específicas da transação, como o teto de desconto ao crédito tributário e a possibilidade de parcelamento, ainda dependem de atos normativos complementares, que deverão ser publicados em breve.
Conclusão
O Programa de Transação Integral surge como uma ferramenta eficaz para a redução do contencioso tributário de alto impacto econômico, promovendo a regularização de passivos de maneira consensual e mitigando os riscos de longos litígios judiciais.
Ao permitir que empresas e governo negociem débitos de forma mais transparente e previsível, o PTI fortalece a segurança jurídica e pode contribuir para um ambiente econômico mais estável.
O sucesso do PTI, entretanto, dependerá da clareza nas regulamentações futuras e da adesão dos contribuintes a essa nova forma de resolver suas pendências tributárias. A expectativa é que, com o avanço das normas complementares, o programa se torne uma peça-chave na modernização do sistema tributário brasileiro, com benefícios duradouros para todas as partes envolvidas.